A conferência HIMSS é um evento anual que reúne profissionais da saúde, tecnólogos, pesquisadores e empresários de todo o mundo para discutir e explorar as últimas inovações em saúde digital e gestão de informações de saúde. A edição de 2024 ocorreu em Orlando (EUA), e contou com a participação de mais de 30.000 profissionais de mais de 70 países, destacando-se como o maior encontro de profissionais de tecnologia da saúde em âmbito mundial.
Neste artigo, vou apresentar alguns dos principais insights e tendências que percebi na minha participação no evento em 2024. A HIMSS se consolida como um encontro que marca os grandes temas da saúde digital e tecnologia no mundo, tornando-se referência para executivos do setor.
Neste artigo, vou apresentar:
- As tendências transversais aos grandes temas do evento
- Os grandes temas da conferência
- Abordagens para startups da área da saúde
1. Tendências transversais aos grandes temas
Duas tendências já discutidas em outros momentos e eventos continuaram a ser assunto recorrente vinculado aos grandes temas do evento. A primeira é uma lógica crescente de organização das soluções em modelos de negócio em plataforma, reforçando a necessidade de integração dos dados e jornadas de saúde. A segunda é a capacidade financeira de absorção dos sistemas de saúde para novas tecnologias, reforçando o tema de saúde baseada em valor.
Organização de soluções em modelos de negócio em plataforma
A primeira tendência transversal percebida já nas primeiras horas de conferência foi a crescente preocupação dos grandes players em criar ecossistemas integrados que facilitam a colaboração e a inovação.
Esses modelos de plataforma buscam conectar diferentes stakeholders no setor de saúde, como prestadores de serviços, pacientes, desenvolvedores de tecnologia e pesquisadores, para gerar valor através do compartilhamento de dados, insights e funcionalidades. O objetivo é criar ambientes em que os participantes possam se beneficiar de acesso mais fácil a informações, serviços melhorados e inovação acelerada.
Não foi raro casos em que grandes empresas compartilhavam o mesmo espaço/stand com soluções totalmente integradas complementando processos específicos. Essa abordagem visa não apenas melhorar a eficiência e os resultados dos cuidados de saúde, mas também impulsionar a transformação digital e a inovação contínua no setor.
Saúde baseada em valor (VBHC) nas mesas de negócio
O Value-Based Health Care (VBHC), saúde baseada em valor, foi um tópico recorrente nas mesas de apresentação de soluções e negociação, refletindo a transição do setor de saúde para um modelo mais focado nos resultados (desfecho e financeiros) do paciente.
Essa abordagem enfatiza a entrega de cuidados de saúde que são medidos e remunerados com base na qualidade e eficácia dos resultados clínicos em relação ao custo. O tema é recorrente, mas é nítido que o setor no mundo todo ainda precisa de passos significativos nesse sentido.
As discussões em torno do VBHC abordaram como as organizações podem implementar estratégias e tecnologias para melhorar a qualidade do atendimento, reduzir custos e otimizar a experiência do paciente. Já não existe mais discussão de tecnologia sem análise de efetividade e viabilidade financeira, reforçando a dificuldade do sistema em absorver financeiramente a tecnologia isolada.
Isso incluiu a adoção de tecnologias digitais, principalmente baseada em dados, para analisar e melhorar os resultados dos cuidados de saúde, incentivando práticas que alinham os interesses dos prestadores de cuidados, pacientes e pagadores para promover cuidados mais eficientes e eficazes.
2. Grandes temas da conferência
O HIMSS 2024 abordou uma gama enorme de tópicos e tecnologias emergentes, mas três temas principais se destacaram:
Inteligência Artificial (IA)
Como não poderia ser diferente em 2024, a inteligência artificial (AI) na saúde foi um tema central do evento, com ênfase particular na IA generativa. Além das aplicações já conhecidas para melhorar a precisão diagnóstica por entradas de dados diversos (texto, imagem e, agora, vídeo), o tema mais explorado foi o uso de IA para personalizar o atendimento ao paciente.
As discussões abordaram como a IA pode otimizar os fluxos de trabalho clínico e administrativo, reduzindo o tempo gasto em tarefas operacionais e permitindo que os profissionais de saúde se concentrem mais no cuidado ao paciente, abordando muito o conceito de personalização em massa.
Dentro do tema de Inteligência Artificial, grande parte das discussões destacaram também a necessidade de abordar as implicações éticas e legais da integração da IA na saúde, como questões de privacidade de dados, consentimento informado e como evitar o viés algorítmico, garantindo que a IA seja usada de maneira justa e transparente.
Cibersegurança e proteção de dados
Os recentes ataques cibernéticos em instituições de saúde, abordados diversas vezes na conferência, trouxeram à tona a necessidade de estratégias robustas de proteção de dados no setor de saúde, especialmente contra os ataques, reforçando a importância da inovação e colaboração contínua em cibersegurança.
Foi abordada a preocupação crescente, além da camada de tecnologia, com o fortalecimento de cultura de cibersegurança em toda a organização, desde a formação e conscientização dos funcionários até a implementação de tecnologias avançadas para detectar e prevenir ameaças. A cooperação entre organizações de saúde, fornecedores de tecnologia e reguladores também foi considerada essencial para fortalecer a defesa contra ameaças, reforçando o tema transversal de plataformas.
Interoperabilidade de dados e integração tecnológica
A interoperabilidade de dados e a integração tecnológica foram amplamente discutidas, com um foco particular na maneira como esses elementos são fundamentais para impulsionar o cuidado baseado em valor (VBHC). Diversas sessões de conteúdo da conferência exploraram como a integração eficaz de diferentes sistemas e tecnologias de saúde pode melhorar a coordenação do atendimento, otimizar os resultados dos pacientes e reduzir custos.
A interoperabilidade não é apenas uma questão técnica, mas também uma questão de política pública e prática, exigindo a colaboração entre provedores de saúde, tecnólogos e reguladores. A necessidade de padrões comuns de dados para permitir o compartilhamento seguro e eficiente de informações de saúde entre diferentes plataformas e instituições foi um ponto-chave. Isso inclui a adoção de normas e padrões únicos de dados e a implementação de protocolos de comunicação que facilitam a troca de dados entre diferentes sistemas de saúde.
3. Abordagens para startups
Além das sessões de conteúdo, o evento também proporciona uma vitrine e discussões relevantes para startups que estão remodelando o setor de saúde com soluções inovadoras. Programas da própria HIMSS e o Startup Park (bloco da exposição dedicado às startups), destacaram as oportunidades para startups e empreendedores, focando principalmente nos grandes temas (Inteligência Artificial, Cibersegurança e Interoperabilidade) para resolver problemas de saúde atuais e futuros.
O cenário atual para startups no setor de saúde, apesar das grandes oportunidades, é delicado e exige cautela dos empreendedores. Um grande desafio discutido foi o acesso ao capital para inovação em saúde, que continua sendo uma grande barreira, especialmente para startups em estágios iniciais.
A necessidade de investimentos substanciais em pesquisa e desenvolvimento, juntamente com a complexidade regulatória do setor de saúde, pode expor novos negócios a cenários de risco extremo. Além disso, as startups precisam provar a eficácia e a segurança de suas inovações em um ambiente extremamente regulado, o que frequentemente exige ensaios demorados e caros.
Outro ponto da discussão em destaque para as startups de saúde foi o ambiente cada vez mais competitivo e desafiador com as bigtechs (Google e Microsoft, por exemplo), que criam soluções cada vez mais sofisticadas que substituem soluções desenvolvidas por startups nos últimos anos, já integradas e no formato “plug and play”.
Essas empresas possuem recursos técnicos, financeiros e canais substancialmente superior, o que lhes permite desenvolver soluções de inteligência artificial altamente sofisticadas e prontas para serem implementadas.
Além disso, as soluções das bigtechs frequentemente vêm com a promessa de integração nativa com outras tecnologias já utilizadas por hospitais e clínicas, aumentando o atrativo para os clientes finais. Este cenário pode limitar o espaço para inovações independentes e diminuir a visibilidade de soluções disruptivas propostas por startups, forçando-as a encontrar nichos muito específicos ou a inovar de maneiras que as grandes empresas ainda não exploraram.
Conclusão e perspectivas futuras
A HIMSS 2024 reafirmou a importância de combinar tecnologia, processos e pessoas para inovar no setor de saúde. Para startups, isso significa uma grande oportunidade de se destacarem no mercado global de saúde, adotando inovações tecnológicas, focando em segurança cibernética e colaborando com parceiros estratégicos para desenvolver soluções que melhorem o cuidado ao paciente e otimizem os custos operacionais.
Nas últimas semanas, também participei de um painel sobre as tendências da HIMSS com os colegas Dr. Luis Romagnolo (Hospital de Amor), Marcelle Bronzoni (Elsevier) e Richard de Martini (Siemens Healthnieers), você pode assistir o conteúdo na íntegra abaixo: